A mudança, tantas vezes repelida e indesejada pelos seres humanos, é indeclinável: está inscrita nos mais profundos níveis da realidade, desde os mais ínfimos e básicos tijolos da matéria, até às incomensuráveis estruturas cósmicas. O próprio tempo não é absoluto e varia, literalmente, numa relação inversamente proporcional à velocidade a que nos deslocamos. Se nada existe para além dos limites do Universo, a sua expansão implica geração do inerente espaço que, assim, deixa de ser, aos nossos olhos, uma entidade física estática e imudável. Se existe qualquer coisa, em vez do nada que antes existia, é porque a modificação é inelutável. A própria matéria não é eterna; até os quarks, existentes desde a alvorada da realidade, desintegrar-se-ão, transformando-se em radiação, num futuro inconcebivelmente distante…
No plano filosófico, todas as verdades são permissíveis, mas o pragmatismo da ciência tem conseguido, nos últimos séculos, elaborar um modelo coerente e racional que, embora longe de decifrar tudo, possibilita um bom entendimento das coisas.
Vídeo: Excursão ao Espaço-Tempo (www.youtube.com/watch?v=PsG3qdKIKYE)
Nascem astros em catadupa, uma vez mais a gravidade a ser protagonista, exercendo o seu efeito aglutinador, comprimindo a matéria abundante, elevando a temperatura até ao ponto em que os átomos de hidrogénio se fundem uns nos outros, ejaculando energia num nuclear êxtase de luz, gerando uma prole de novos elementos, parindo em tetania as peças elementares de que somos feitos. Discos de acreção, num remoinhante baile celeste, convertendo-se em minúsculas mas crescentes entidades, um cortejo protoplanetário em torno do luzeiro. Milhares de milhares de estrelas, aglomeradas em galáxias, vivendo até ao esgotamento do combustível, ruindo no final para dar lugar a uma nova geração, as ondas de choque dos estertores da morte servindo de rastilho à reorganização dos gases, um empurrão cinético que permitirá a ignição. Pélagos espaciais, milhões de anos-luz, preenchidos por longos e brilhantes fios galácticos, numa rede aparentemente homogénea e isotrópica, um universo finito mas ilimitado, expandindo-se eternamente ou, quem sabe, atingindo um ponto em que o retrocesso se tornará inevitável, até que, éons depois, a grande implosão tratará de devolver ao universo a singularidade. E o ciclo a repetir-se…
Vídeo: Nascimento, Vida e Morte de Uma Estrela (http://www.youtube.com/watch?v=za4KL0l89gw )
Diante dos nossos olhos, e tão difíceis de serem vistos, desenvolvem-se os jogos da matéria. Inauguraram-se, há quase catorze mil milhões de anos, numa fulgurante e inimaginável explosão, o vazio transformado em energia, o nada transfigurado em tudo, o tempo dimanando de onde antes nem a eternidade fazia qualquer sentido. Antecedentemente, apenas o inconcebível vácuo, desprovido de dimensões e de significado, ovo quimérico que poucos ousam controverter, ínfima bolha condensada de forças titânicas, encerrando-se a si própria, contendo o Universo. Mas, escutemos o tempo que, lenta ou velozmente, leva a cabo a sua obra, acordando a matéria, separando a gravidade das outras forças fundamentais, o incomensurável calor dos primeiros segundos esvaindo-se, a expansão inflacionária a consentir que germinem quarks, os quarks formando protões e neutrões, a génese dos elementos a acontecer, a verdadeira alquimia a ter lugar. E, quase meio milhão de anos depois, a luz, fúlgida e cintilante, irrompe intempestivamente da prisão da gravidade, enchendo o espaço com o seu brilho, iluminando os grumos de matéria em contínua transformação…
Vídeo: Aquém da Grande Explosão (http://www.youtube.com/watch?v=hSZqhqR5XKM&feature=related )
Imensas correntes oceânicas, transportando incomensuráveis massas de água, circulam através dos oceanos, modelando as condições atmosféricas. Tempestades eléctricas rasgam a noite com deslumbrantes descargas de energia, enquanto nuvens negras de chuva assombram a superfície de um planeta que respira, que se movimenta, que chora e padece, que evoluciona e frutifica, animado por um sopro de vitalidade, instilado pela querença da Grande Arquitecta, as dinâmicas e cíclicas variâncias climatéricas resultando num maravilhoso e precário equilíbrio. Tudo devemos à prodigiosa torrente de energia, proveniente da Estrela Mãe, qual centelha que ateia e ceva os mecanismos, em contínua operação, de toda e qualquer estrutura biofísica, numa veemente recusa de condescender à estagnação. A vida, abraçando todos os recantos, floresce pela luz, a máquina dos estados do tempo é posta em movimento por desigualdades na quantidade de calor recebida em latitudes diferentes, e até o humor dos meus iguais varia em função de céus limpos ou de dias nublados. Ventos ciclónicos ou brisas cálidas, dilúvios bíblicos ou secas infernais, temperaturas gélidas ou amenas tardes estivais, nada mais são que manifestações de um clima num sempiterno ciclo de mudança.
Imagem: Mudança das Estações (www.youtube.com/watch?v=hH8UMbzgIAE)
O mundo não tem descanso, não há imutabilidade alguma na lenta mas contínua movimentação do chão sob os nossos pés. Não há placitude no imo de um corpo vivo e pulsante, alojamento da fornalha nuclear geradora do calor que faz da nossa morada um planeta em contínua evolução, mudando a cada instante das longas eras, transformando a face, a tectónica das placas gerando montanhas soberbas e insondáveis fossas abissais, fendendo, por vezes abrupta e brutalmente, o tegumento deste pequeno e isolado lugar, onde assistimos inquietos ao desfiar da nossa existência. Ilhas nascem e são destruídas, meras cidadelas de lava em praia fustigada pelas vagas da eternidade; chaminés expelem para a atmosfera gases primordiais, a Terra expectorando as próprias entranhas. Derivam continentes inteiros, como se de barquinhos em miniatura se tratassem; as correntes magmáticas da astenosfera, desenvolvendo colossais forças de atrito, empurram e remodelam, energia assombrosa metamorfoseando o mapa-mundi.
Vídeo: Deriva dos Continentes (www.youtube.com/watch?v=ft-dP2D7QM4&feature=related)
Detenho-me, absorto em divagações sobre a intrínseca natureza das coisas, e reavalio as noções de permanência e de mudança. Não há remanso no coração da matéria. Nos esquisitos e mal compreendidos domínios do infinitamente pequeno, operam-se, incessantemente, subtis e prodigiosas alterações. Forças em permanente actuação, consumadas por bosões energéticos, são as manifestações de um campo unificado de quatro faces. Pedem energia ao princípio da incerteza, ganham existência e, rodopiando incansavelmente, mantêm coesa a fina estrutura de tudo, exercendo um férreo domínio sobre os fermiões. Feita de corpúsculo ou de ondas, a realidade é o resultado de algo muito menos compreensível do que aquilo que os nossos sentidos afirmam: a espuma de actividade transvaza, borbulhante, até naquilo a que chamamos de vácuo. Pois que fértil é o campo quântico, onde a todo o instante são criados pares partícula-antipartícula que, embora de existência fugaz, retratam um ininterrupto ciclo de transformação.
Imagem: Campo Quântico (http://pdg.cecm.sfu.ca/~warp/exp7f1.gif)
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