AVISO
Avisam-se os estimados leitores que, até Setembro, este local estará encerrado para férias. Não, não serão efectuadas quaisquer obras, pois nem a ASAE nem o governo levantaram qualquer auto de notícia.
Esta tabuleta foi pintada por mim mesmo, não tendo havido lugar discussões quanto a cores e formatos.
“No escaldante deserto da sua existência, percorria penosamente um caminho em círculos, a língua seca e intumescida, a sede a infernizá-lo, a pele vermelha de fogo e seca de sol. Os lábios gretados e entreabertos pareciam clamar por algo que não estava ao seu alcance, e mal abria os olhos: deixara de conseguir suportar a luz intensa que o ofuscava. Precisava de uma sombra, sonhava com um oásis de frescura que sabia existir algures a sul, ou a norte, já nem sabia… Aliás, parecia-lhe agora nunca ter sabido. Os seus passos sucediam-se, mecânica e compassadamente, sem rumo, tal como os pensamentos, ritmadamente desconexos e tão absurdamente gritados dentro de si próprio. Seria a cadência acelerada da pulsação, o louco latejo das suas veias salientes a dar-lhe a ilusão de ouvir o martelar seco de mil vozes em uníssono? Seria a hipertermia a responsável pela fantasia, repetitiva e insidiosa, de estar cada vez mais próximo de um fresco e prateado ribeiro, cheio de promessas e de esperanças? Não iria desistir enquanto as evanescentes forças o não abandonassem de vez. Porque a resignação não o faria encontrar a paz e a busca, essa, continuaria…”
V.A.D. em Algures.
Imagem: Meditando no Deserto (www.ufrgs.br/fotografia/port/05_portfolio/olga_gouveia/images/Meditando-no-Deserto.jpg)
O último e agonizante grito do Sol agigantou-o até engolir a própria Terra, e energia vermelha incinerou tudo o que restava na superfície. A estrela, outrora pulsante e cheia de vivacidade, entrou no seu derradeiro estágio e encolheu até ficar do tamanho de um planeta. O coração da anã branca continuou, durante evos, a irradiar a energia produzida pela fusão do carbono e do oxigénio até que, por fim, a gélida obscuridade tomou conta de tudo.
Na mina, o corpo do tirano jazia sem vida. O suprimento de tudo o que é necessário à existência esgotara-se havia muito tempo. Nem planos, nem máquinas, nem a magnífica inteligência humana conseguem contrariar a entropia.
Posfácio
Há quinze ou vinte anos, era eu ainda um adolescente, tive a oportunidade de ler um fabuloso conto de ficção científica, do qual não me lembro nem do título, nem do autor. Sei, contudo, que a incrível história me marcou, a ponto de ter procurado inúmeras vezes o velho livro, para o reler. Nunca o encontrei; provavelmente emprestei-o e, como acontece tantas vezes, não mais foi devolvido. Aquilo que fiz ao longo destes cinco posts foi uma tentativa de recriar parte da história, pegando em elementos que me ficaram na memória. Outras partes reflectem aquilo que supostamente acontecerá ao nosso Sol e ao nosso planeta, dentro de muitos milhões de anos. As palavras são minhas, e sei bem que me falta a mestria do autor do conto original, mas esta é a minha forma de o homenagear.
Imagem: Desolação (http://images.inmagine.com/168nwm/imagesource/is228/is228034.jpg)
Não…Quatro mil e quinhentos milhões de anos não são a eternidade: escoaram-se como areia por entre os dedos de uma mão aberta. No núcleo da estrela que foi o sustentáculo de tudo, o hidrogénio esgotava-se, e a velha fornalha nuclear enfraquecia, deixando à gravidade a palavra final. Colapsos consecutivos, seguidos de expansões violentas, eram os estertores de uma morte anunciada. A cada contracção, um intenso flash de hélio iluminava as lúgubres planuras espaciais e, na Terra, a temperatura tornava-se insuportável. Rios secavam, mares evaporavam-se, e a vida, que nada podia contra a escaldante aridez, ia lentamente perdendo a batalha. O que restava da humanidade partira há muito, rumo às estrelas, em busca de um novo e mais acolhedor local, onde os filhos dos seus filhos pudessem prosperar. O berço tinha sido abandonado em definitivo...
Imagem: Flash de Hélio (http://outreach.atnf.csiro.au/education/senior/astrophysics/images/stellarevolution/redgiantartistnasa.jpg)
Trinta e três anos se passaram. O desaparecimento misterioso do ditador fora motivo de regozijo moderado. Há sempre quem se sinta mais ameaçado pela esperança de liberdade do que pela monótona dureza de uma vida agrilhoada. Nas profundezas da mina, a máquina zumbia, alheia a convulsões sociais e a reajustes de poder e, no seu interior, aquela espécie de coma sem sonhos do déspota seguia o seu curso, indiferente à feroz guerra civil que havia eclodido. Múltiplas facções lutavam pelo domínio; usavam de todos os meios para o conseguir e, numa cegueira raivosa, não hesitavam em empregar mísseis nucleares. Um deles, vítima de súbita avaria, despenhou-se e explodiu num local ermo. Toneladas de rocha vaporizada precipitaram-se sobre o olho que contava os dias. Para o computador, o tempo havia parado…
Montanhas nasceram e desfizeram-se em pó, oceanos engoliram continentes inteiros, civilizações ergueram-se e declinaram, incontáveis gerações arrastaram-se penosamente sobre este nosso velho planeta. A própria humanidade tornou-se irreconhecível, à medida que os éons se escoavam. O coração do Culpatu pulsara apenas alguns milhares de vezes…
Imagem: Oceano (www.nhptv.org/natureworks/graphics/ocean.jpg)
E foi assim que os planos foram meticulosamente elaborados e a máquina soberbamente construída, sob um sigilo absoluto. O Culpatu dispunha de meios para o conseguir: nos regimes autocráticos falar demais é perigoso, e os homens depressa se tornam meros robots acéfalos quando se trata de preservar a própria vida… Um olho electrónico, camuflado e à superfície, sentiria a sequência dos dias e das noites e, passadas quarenta mil alvoradas, o computador iniciaria a sequencia que haveria de fazer a besta retornar à verdadeira vida. Um pouco mais de cem anos, uns poucos batimentos cardíacos e ninguém que o tivesse conhecido estaria ainda vivo. Não seria incomodado; adaptar-se-ia facilmente às mudanças, ou não fossem todos os ditadores dotados de grande inteligência e de extraordinárias capacidades. Viveria faustosa e despreocupadamente, separado das atrocidades que cometera pela densa cortina de um passado que sempre tende a ser rapidamente esquecido. Sim, que a humanidade tem memória curta! Os registos, por muito fiáveis que sejam, não apreendem as emoções e as dores: são desprovidos de sentimentos e nunca substituirão aquilo que o cérebro guarda...
Imagem: Robots (www.icicom.up.pt/blog/take2/robot-robots.jpg)
As décadas arrastavam-se, penosamente, para as gerações que lhe foram sucedendo. Para o Culpatu, enclausurado naquela máquina da eternidade, um século não era mais que um minuto, e a contínua sucessão de dias e noites pouco representava. A câmara selada, construída no interior de uma velha e há muito abandonada mina de tungsténio, garantia-lhe segurança e impunidade. Sistemas complexos, alimentados por energia solar e por um pequeno mas eficaz gerador nuclear, mantinham a temperatura dois graus acima de zero, enquanto válvulas e sensores se encarregavam da atmosfera, garantindo as oitenta partes por milhão de sulfeto de hidrogénio, necessárias à animação suspensa. Nunca a civilização havia assistido a uma tão grande brutalidade por parte de um ditador. As fragilidades do tecido social haviam criado um monstro que não hesitara em se apoderar, a seu bel-prazer, da vida de mil milhões de almas, manipulando-as primeiro e escravizando-as de seguida, até acumular um poder e uma riqueza inimagináveis. Mas não tinha ninguém em quem confiar, e o constante medo de ser traído por quem lhe era próximo, o medo de ser assassinado, o medo da rebelião eminente, o medo levou-o a procurar uma fuga. Mas, para onde? Não havia um único local no velho planeta onde se pudesse esconder. Restava-lhe apenas uma solução: fugir para o futuro para escapar do futuro…
Imagem: Mina (www.chayden.net/Allison98/pic/mar01-018.jpg)
A melodia do canto de algumas aves é uma das mais sofisticadas formas de comunicação do reino animal. E entender a sua complexidade é abrir as portas para um mundo inimaginado. Na verdade, estudos sobre a linguagem dos pássaros revelaram algumas notáveis semelhanças entre os cérebros destes e dos humanos, e trouxeram à luz informações surpreendentes sobre a forma como eles aprendem. Alguns dos sons emitidos, tais como o simples cacarejar das galinhas, são inatos, mas alguns cantores mais evoluídos desenvolvem o seu repertório através de uma misteriosa interacção entre o conhecimento aprendido e o herdado. Indivíduos de ouvido apurado imitam os mais velhos e, em algumas espécies particularmente versáteis, podem dominar mais de uma centena de temas. Descobriu-se ainda que o hemisfério esquerdo do cérebro controla o canto dos canários, da mesma forma que nos humanos controla a fala. Tal especialização, que se julgava exclusiva da nossa espécie, pode ser de extremo interesse para o avanço da neurologia.
Queria descer os abismos do passado e retornar à alvorada dos tempos. Queria voar sobre o incandescente oceano de magma, aquecido pela fornalha radioactiva alimentada pelos elementos pesados, gerados há incontáveis evos no interior de supernovas nunca vislumbradas. Queria assistir à formidável chuva de meteoritos, qual fogo de artifício a riscar céus negros como breu, e presenciar os eventos cataclísmicos resultantes de tal portentoso espectáculo. Queria maravilhar-me com a desolação hadeana e assistir à dança rodopiante dos pedaços de Terra fazendo a Lua. Queria olhar directamente para o jovem Sol, ainda pálido e sem forças, e sentir na pele a feroz força da radiação crua. Queria sentir nos meus pulmões, por breves segundos, a estranha mistura de gases que compunham aquela atmosfera nova, de cor laranja, onde cada vez mais nuvens carregadas de água iam largando dilúvios. Queria ver o nascimento dos primeiros rios, sobre os primevos basaltos… Queria viajar no tempo e ver…
Imagem: Hadeano (http://www2.uol.com.br/sciam/imagens/materia/abre_terra.jpg)
O coração bate cerca de setenta vezes por minuto, mais de dois mil milhões de vezes em toda a vida, e aparentemente tem uma vida própria. As fibras musculares que o compõem diferem das de outras partes do corpo, no facto de que algumas delas geram os seus próprios impulsos eléctricos sem receberem sinais do cérebro. Com efeito, o coração de um feto começa a pulsar ainda antes de se formarem as conexões nervosas. O marca-passo natural do coração é um grupo de células auto-estimuláveis que constituem o nódulo sinoatrial, ou NSA. Localizada na parede do átrio (ou aurícula) direito, esta área envia impulsos ao nódulo atrioventricular, que fica no septo, a parede muscular que divide o coração. Os sinais viajam pelo feixe de His, em direcção a um conjunto de fibras nervosas, chamado rede de Purkinje, que recobre os ventrículos, e daí para todo o coração, causando uma contracção. Não se sabe o que dá início à corrente no NSA, mas as suas células comportam-se mais como neurónios do que como fibras musculares…
Imagem: Nebulosa do Coração (http://apod.nasa.gov/apod/image/0610/heart_russell_big.jpg)
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