“Entre um anel marejado de inscrições, apertava, sob a mesa de pedra, o lenço perfumado com flor-de-lis, numa raiva mal contida por ter mostrado fragilidade, por ter violado a distância que deveria ter mantido com aquele homem de braços atordoantemente quentes. Fingindo uma insólita concentração na tâmara que levava à boca, observava-o. Vendo-o a olhar fixamente as linhas de carvão tentava não abrir uma janela para a sua alma, mas para a imagem que ele construía, engrenagem a engrenagem, na sua mente. Vendo-o a morder o lábio inferior rubro era fácil imaginar as mais de três dezenas de roldanas a girarem umas sobre as outras com um tinido metálico que ecoava pelo seu entendimento, os milhares de dentes a encaixarem numa perfeição talhada num imaterial bronze, o trabalhado desenho dos ponteiros a moverem-se no quarteto de mostradores a cadências matematicamente precisas. Vendo-o a criar uma expressiva ruga na testa adivinhava que tentava deslindar a função do engenho esboçado pelo meu pulso que havia intencionalmente omitido medições, legendas e pormenores. Transferi a minha atenção para a abobada celeste cujo brilho das estrelas não era nem perturbado pela ira do nórdico Thor, nem sequer ofuscado pelo usual astro nocturno do egípcio Thot que hoje mostrava o seu lado negro. Porquanto, o firmamento era o cúmplice que ali partilhava os segredos do maravilhoso mecanismo.
Hiparco continuava a passar os dedos pelas fibras do papel, deixando as pontas seguir os sulcos das delicadas curvas que eu havia traçado com o movimento demasiadamente carregado. Ela fazia-o com a lentidão de dama que borda um véu de linho, com a perícia de escultor que examina um alto-relevo dum túmulo de faraó, com o afecto de homem que afaga as harmoniosas curvas duma mulher. O pensamento das suas mãos numa carícia pela minha pele nua causou-me um arrepio por todo o corpo, reprimi-o e agarrei ainda com mais força o lenço por baixo da mesa. Só então, ainda sentido a textura suavemente adocicada da tâmara nos lábios húmidos, fiz a pergunta que me havia levado àquela quente noite egípcia...”
Sophia
V.A.D. e Sophia em Antiquitera
Imagem: Mecanismo (II) (www.bilbaoblogs.com/res/escepticos/Antiquitera.jpg)
“And the night came on
It was very calm
I wanted the night to go on and on
We were (…) in Egypt”
Fim da Primeira Parte
(Por ausência de um dos intervenientes na parceria, o conto será retomado assim que possível)
De
Lazy Cat a 22 de Março de 2008 às 15:01
...e o coelhinho das amêndoas foi com o Pai Natal no comboio ao circo....
e a imaginação não tem limites!
Tem??
Vejamos...
De
V.A.D. a 22 de Março de 2008 às 22:31
Gosto de pensar que a imaginação é uma das poucas coisas que realmente não está sujeita a limites ou imposições de qualquer espécie. Na verdade, apenas depende da capacidade criativa de quem a usa... Espero, em meu nome e no da Sophia, que este exercício possa suscitar algum interesse por parte de quem o vai lendo.
Amiga, agradeço as tuas amáveis palavras e aproveito para te desejar também uma óptima noite e um magnífico domingo de Páscoa, cheio de alegria e amêndoas!
Um beijo e um enormeeeeeeeeeee sorriso... :-)
Nao se deixa uma historia destas assim, parada... queres levar porrada?! :) Boa Páscoa, amigo e bj gd
De
V.A.D. a 22 de Março de 2008 às 22:38
Amiga, este é um caso em que nada há a fazer. Devido a uma ausência necessária e incontornável, vemo-nos na contingência de adiar o seguimento do conto, até quarta ou quinta-feira... Se alguém tem de levar porrada, eu não sou...! Mas, como gentleman que me arrogo de ser, ofereço-me para a suportar, se me prometeres que não vais ser muito violenta, ahahahahah... :-)))
Desejo-te também uma óptima noite e um domingo de Páscoa cheio de alegria e amêndoas!
Um beijo e um enormeeeeeeeeeeee sorriso... :-)
De
Emanuela a 23 de Março de 2008 às 01:57
Mas Vad, a última escrita foi da Sophia... tu podias pelo menos publicar mais um capítulo escrito por ti e depois parar para esperar a volta dela...Putz. Magoamos...
Beijinhos
De
V.A.D. a 23 de Março de 2008 às 02:15
Amiga, eu compreendo a tua sugestão. Embora não planeada, esta paragem é inevitável. Verás que faz todo o sentido, termos terminado a primeira parte com este capítulo, pois a segunda parte desenvolver-se-á num tempo e num lugar diferentes, embora os protagonistas sejam os mesmos.
Vou aproveitar este interregno para publicar mais uns excertos da "Clepsidra", que embora não seja propriamente um conto, tem também uma forte componente histórica, o antigo Egipto sendo o cenário... :-)
Desejo-te uma óptima noite e um domingo de Páscoa cheio de saúde e alegria!
Um beijo e um enormeeeeeeee sorriso... :-)
Uffff... fim... da primeira parte! Por momentos acreditei que iam deixar os vossos leitores na maior das frustrações!
Uma boa noite para vocês.
De
V.A.D. a 24 de Março de 2008 às 01:32
Olá, amiga :-) A divisão do conto em duas partes não estava planeada, mas teve forçosamente de ocorrer, devido a ausência da Sophia. Aproveitaremos para recomeçar a história num outro tempo e num outro lugar, embora com os mesmíssimos protagonistas... :-)
Votos de uma magnífica noite e de uma excelente semana!
Um beijo e um enormeeeeeee sorriso... :-)
De Café com Natas a 24 de Março de 2008 às 00:30
"... as lágrimas que pareceram gotas de ouro, certamente a luz amarelada dos archotes criando uma ilusão...."
Ainda trouxe esta frase do capitulo anterior!
Não me vou alargar muito. Direi somente que é digno de um guião para um filme. E a banda sonora espectacular.
Parabéns aos dois
De
V.A.D. a 24 de Março de 2008 às 01:46
Olá, amiga...! :-) Freyja é a principal deusa do panteão nórdico, atribuindo-se-lhe diversas características, entre as quais se conta a estranha propriedade das suas lágrimas, que se transformariam em ouro. Quis aludir a esse aspecto dando, de forma velada, uma explicação para tão inusitada ilusão... :-)
Agradeço as tuas amabilíssimas palavras, em meu nome e no da Sophia.
Enche-me de satisfação, saber que o conto tem podido ser agradável aos olhos de quem o lê...!
Desejo-te uma óptima noite e uma semana maravilhosa!
Um beijo e um enormeeeeeeeeeeeee sorriso... :-)
De
dhyana a 26 de Março de 2008 às 22:12
fimdaprimeiraparte!!! isto não se faz... Sophia, concordaste com isto?!
Apetecia agora atar-vos ao computador até me darem um fim.
e ñ mando beijos!
De
V.A.D. a 28 de Março de 2008 às 02:17
Ahahaha, amiga, o conto só teve de ser dividido em duas partes porque a Sophia teve de se ausentar, durante uns dias, embora ela me tivesse confidenciado que teria preferido não o ter de interromper...
Contudo, a esta altura, já está retomada a história, um novo capítulo já publicado e um outro pronto para publicação, o desfecho aproximando-se cada vez mais... :-)
Desejo-te uma magnífica noite!
Um grande beijo e um enormeeeeeeee sorriso... :-)
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