“A refeição foi frugal, as ostras e os peixes, as aves e as variadas carnes de caça soberbamente apaladadas sendo apenas provadas, numa inventada justificação para cada momento com Freyja, a sua presença parecendo libertar-me da necessidade de alimento, a sua voz serenamente feminina e simultaneamente firme envolvendo-me num universo tão dissemelhante daquele em que sempre havia vivido, os demorados gelos e os tumultuosos mares setentrionais descritos com perícia, as imagens formando-se na minha mente como se estivesse perante a magnitude de tais cenários. Falou-me de um tempo em que a sua estirpe governava o cume do mundo, dos dias em que a primavera fugia para norte, a neve transfigurando-se na água que enchia os rios, os botões explodindo em folhas e flores num ciclo interminável de renascimento da vida, um indescritível sorriso iluminando-lhe o rosto, a sua beleza ou o vinho fazendo-me sentir um estranho ruborizar das faces, um fascínio indizível despontando em mim…
As horas entravam noite adentro, os figos e as nozes acompanhando o hidromel bebericado entre frases e descrições, o semblante subitamente carregado, os olhos marejando-se-lhe de lágrimas, a recordação de uma violenta batalha entre potestades fazendo-a irromper em soluços. O Ragnarok havia posto cobro à influência da sua família e determinado o seu exílio em terras mais meridionais. Num impulso incontido, abracei-a, o toque fazendo-a acalmar-se de imediato. Recompondo-se, limpou com um fino lenço de linho as lágrimas que pareceram gotas de ouro, certamente a luz amarelada dos archotes criando uma ilusão. Desenrolou o papiro que havia trazido. Nele, insuspeitáveis conhecimentos apareciam desenhados com geométrica precisão…”
V.A.D.
V.A.D. e Sophia em Antiquitera
Imagem: Mecanismo (www.ams.org/images/smallgears.gif)
De
emanuela a 22 de Março de 2008 às 00:21
Boa noite meu amigo.
A história está a delinear-se maravilhosa, tanto nos teus escritos como nos da Sophia.
Quanto ao capítulo hoje publicado, teus descrições de sentimentos nascendo são cheios de doçura e calor. O toque de um abraço mostrando-se capaz de serenar o coração entristecido da protagonista. Sempre me encanto com descrições de ternura,mas também prendo-me aos pormenores descritos que falam da beleza de lugares de tempos antigos e dos conhecimentos que hoje parecem difíceis de resgatar...
Um beijinho, amigo.Desejo que a tua Páscoa possa se revelar sempre para vida plena.
De
V.A.D. a 22 de Março de 2008 às 03:14
Boa noite, amiga :-) Fico felicíssimo, por saber que o conto está a revelar-se agradável aos olhos de quem o lê. Não me canso de referir que esta parceria com a Sophia tem sido uma experiência agradabilíssima. O empenho que ela tem demonstrado, a qualidade da sua escrita e os conhecimentos que patenteia são de louvar, especialmente por ser uma jovem de apenas dezoito anos de idade...! Aumentam, a cada dia que passa, a minha estima e consideração por ela.
O capítulo hoje publicado pretende ilustrar a empatia que se pode gerar espontaneamente entre duas pessoas. Numa situação assim, um abraço reconfortante pode operar milagres...
Embora não seja detentor de grandes conhecimentos acerca da História da antiguidade, não deixo de olhar para esta época como um tempo extraordinário, a humanidade, através de algumas mentes privilegiadas, começando a olhar a natureza com um olhar científico e atingindo uma excelência que se viria a perder nas trevas da Idade Média, para voltar a ser recuperada apenas séculos mais tarde. Às vezes tento imaginar o estágio evolutivo em que poderíamos estar, se esse período de retrocesso não se tivesse feito sentir...
Agradecendo, também eu te desejo uma Páscoa cheia de serena alegria, amiga!
Um beijo e um enormeeeeeeeeeee sorriso... :-)
De
Fisga a 22 de Março de 2008 às 13:54
É assim. Há um disco de um autor Brasileiro se não estou em erro que diz assim: Aquele abraço. É exactamente isso, aquele abraço que é dado na hora certa e no momento certo, que opera o milagre dos milagres, onde o mal passa num piscar de olhos a ser o bem desejado. Um abraço e tudo bom.
De
V.A.D. a 22 de Março de 2008 às 22:12
Há pequenos gestos que podem ter um valor incalculável. Neste caso, creio que um abraço seria suficiente para acalmar a protagonista, que se havia deixado levar pela tristeza que as recordações lhe traziam...
Obrigado, amigo. Desejo-lhe também uma excelente noite e um domingo de Páscoa cheio de alegria!
Um abraço.
De
Fisga a 23 de Março de 2008 às 11:34
É verdade amigo. Lá diz o actor português Vítor Espadinha (Recordar é viver novamente) A nossa reacção ao recordar-mos algo, será boa ou má conforme a recordação. Um bom dia de domingo, 23 de Março de 2008, bem repastado e melhor regado, já que este dia, tal como os outros, é único. Um grande abraço.
De
V.A.D. a 23 de Março de 2008 às 20:40
Não podia estar mais de acordo consigo, amigo, quando afirma que este dia, tal como todos os outros, é único. Devemos aproveitar da melhor forma possível os momentos da nossa existência, pois eles passam e, embora as recordações sejam importantes, nunca mais são realmente revividos. Se recordar também pode ser viver, não há como viver para poder recordar.
Desejo-lhe um magnífico final de dia e uma excelente semana!
Um abraço.
De
dhyana a 26 de Março de 2008 às 22:04
Quase que sinto o manuscrito nas minhas mãos...
De
V.A.D. a 28 de Março de 2008 às 02:11
Não te sei transmitir o contentamento que sinto, por perceber que a escrita consegue ter esse poder, as palavras como que se transformando em sensações...*
Obrigado, minha amiga!
Um beijo e um enormeeeeeeeeee sorriso... :-)
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