“Tacteei o solo, o frio do metal acariciando a ponta do indicador que deslizava sobre a lisura, o toque num dos caracteres gravados no ferro despoletando o mais inconcebível e inesperado espectáculo, a cúpula transformando-se em firmamento, o espaço diante de nós enchendo-se de matéria e energia. Num fascinante jogo de luz, presenciámos o nascimento do sistema solar, o núcleo da nebulosa primeva condensando-se numa proto-estrela, dez discos de acreção formando-se numa rotação de matéria cada vez mais aglomerada, os planetas adquirindo formas definidas. Assistimos, perplexos e silenciosos, às mudanças geológicas operadas em Marte pela passagem de quatro mil milhões de anos reduzidos a poucos minutos de magia visual, a inquestionável voz de um locutor expressando-se numa desconhecida linguagem feita de fonemas agudos acompanhando as imagens holográficas. Eram milhares, os símbolos cinzelados, tantos quantos os episódios da incomensurabilidade de uma história rica em eventos e pródiga em catástrofes. Ao vigésimo primeiro, sentimo-nos no interior de uma nave espacial, ouvimos o tonitruante som dos foguetes químicos, vimos a superfície a afastar-se, percebemos o azul rasgado de nuvens brancas ocupando uma área cada vez maior, o planeta gémeo como objectivo daquela viajem concretizada nas brumas de um passado longínquo, o subcontinente indiano, ainda separado da Ásia, alinhando-se sob a órbita geostacionária, a descida num transbordador levando à Terra um pilar de ferro de elevada pureza, um padrão em tudo símile aos que os navegadores portugueses assestavam nas terras que iam descobrindo…”
V.A.D. em Cidónia
Vídeo: O Nosso Espantoso Sistema Solar (www.youtube.com/watch?v=7gLcxafJjPI)
De
**** a 7 de Março de 2008 às 00:00
“o toque num dos caracteres gravados no ferro despoletando o mais inconcebível e inesperado espectáculo” – nós lançámos um disco para o espaço com informação sobre a nossa espécie, eles transcenderam-nos um pouco...
Deveras gosto destes teus “marcianos”, mais do que daqueles tradicionais homenzinhos verdes cujo objectivo é conquistar a Terra e até do que o simpático ET do Spielberg... É maravilhoso esse convite que nos fazem a nós, como espécie, e que deixaria “perplexos e silenciosos” todos os humanos.
A exploração espacial (feita por nós ou por outros seres) tem muito que se pode comparar à exploração marítima. Antes estes seres, agora os teus personagens humanos partiram para “mares nunca dantes navegados” e foram mais além “do que prometia a força humana” (e alienígena)...
De facto... “Cesse tudo o que a Musa antiga canta, que outro valor mais alto se alevanta. // E vós, Tágides minha, pois criado / Tendes em mim um novo engenho ardente”
Beijos
Boa noite
E que continues com este conto com um “...som alto e sublimado, / um estilo grandíloquo e corrente” como tens habituado
Sophia
Ps- A música é fantástica e julgo que te enganaste a numerar o capítulo do conto...
De
V.A.D. a 9 de Março de 2008 às 00:36
Concordo, amiga. O disco dourado, sendo uma magnífica mas infrutífera ideia, não seria mais que uma pálida imagem da fantástica colectânea de informação histórica e científica que a Face do conto contém.
A exploração espacial tem muito a ver com o quebrar de barreiras e alargar de fronteiras, representando também a velha necessidade do Homem de conhecer a sua própria origem e futuro, enquanto ser integrado num Universo vasto e em permanente mudança. Infelizmente, os ditames económicos começam a fazer-se sentir e a investigação pura tem vindo a ser relegada para segundo plano. A I.S.S., por exemplo, funcionará à custa da produção de materiais que só se obtêm em condições de imponderabilidade. Não havendo nada de errado nisto, questiono-me sobre esta tendência, que poderá vir a acabar com um certo romantismo ligado a todos os avanços da humanidade...
Gostei muito da citação de "Os Lusíadas"; adequa-se na perfeição...:-)
Desejo-te uma óptima noite e um excelente domingo!
Um beijo e um sorriso enormeeeeeeeee... :-)
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