O tempo é uma misteriosa entidade, da qual temos apenas uma rudimentar e vaga concepção. É infinitamente mais do que os incomplexos resultados do seu constante fluir, é decididamente algo muito mais profundo que a concepção que nos é proporcionada pelo senso comum ou pela natureza das leis biológicas. Integra o próprio tecido básico do Universo onde vivemos, é irmão gémeo do espaço e nasceu no instante primevo em que, de uma singularidade, dimanou tudo o que existe, matéria e energia libertando-se do confinamento quântico numa inflação desmesurada. Influencia a nossa vida sob todos os aspectos, desde os mais simples e moderadamente controláveis até aos que estão completamente fora da nossa autoridade, sendo a lenta mas contínua caminhada na direcção da velhice ou a inexorável passagem dos dias exemplos dessa nossa inabilidade para o manipular. É subjectivo e desigual, a velocidade agindo como causa de uma estranha variabilidade, aquilo que fazemos dando-nos a impressão de que ele se escoa de forma inversamente proporcional ao nosso apaziguamento. Talvez escorra pelos interstícios dos grânulos espaciais como areia numa ampulheta, mas não é eterno. A eternidade é mais estranha: é o lugar onde o tempo liminarmente cessou…
Imagem: Tempo (http://sprott.physics.wisc.edu/fractals/collect/2000/time%2520out.jpg)
“Nasci no instante que não pertence ao tempo, o passado e o futuro não fazendo sentido, o presente negando a sua própria validade pela eternidade inacessível. Surgi de um ponto infinitesimal, pleno de espaço ilimitado e de densidade infinita, a difícil concepção de tal ovo cósmico exigindo abstracção comparável a genuíno devaneio. Eclodi por mim mesmo, desmentindo a causalidade, afirmando a veracidade da génese espontânea nas dimensões dificilmente engendradas pela maior das inteligências. Brotei do nada, iludindo o caos original, arquitectando pulcras e organizadas estruturas, a lógica parecendo autêntica, o seu efectivo sentido escapando-se por entre os dedos da mão que cerram com desmedida força. Sou vazio que não é sinónimo de nada, a matéria definindo-se pela própria ausência, o estado de mínima energia desnudando a latência das coisas, numa oscilante hibernação que desafia o menos comum dos sensos. Sou campo quântico, essência primordial, as partículas imaginadas dançando ao ritmo pulsante de uma incessante flutuação do vácuo. Sou a extravagante virtude dominativa do ser sobre a sua antítese…”
V.A.D. em Universus
Vídeo: Across The Universe (The Beatles) (www.youtube.com/watch?v=lsuSCwTdxOo)
Detenho-me, absorto em divagações sobre a intrínseca natureza das coisas, e reavalio as noções de permanência e de mudança. Não há remanso no coração da matéria. Nos esquisitos e mal compreendidos domínios do infinitamente pequeno, operam-se, incessantemente, subtis e prodigiosas alterações. Forças em permanente actuação, consumadas por bosões energéticos, são as manifestações de um campo unificado de quatro faces. Pedem energia ao princípio da incerteza, ganham existência e, rodopiando incansavelmente, mantêm coesa a fina estrutura de tudo, exercendo um férreo domínio sobre os fermiões. Feita de corpúsculo ou de ondas, a realidade é o resultado de algo muito menos compreensível do que aquilo que os nossos sentidos afirmam: a espuma de actividade transvaza, borbulhante, até naquilo a que chamamos de vácuo. Pois que fértil é o campo quântico, onde a todo o instante são criados pares partícula-antipartícula que, embora de existência fugaz, retratam um ininterrupto ciclo de transformação.
Imagem: Campo Quântico (http://pdg.cecm.sfu.ca/~warp/exp7f1.gif)
O Universo físico é feito de factos e dos seus contrários. Normalmente não temos consciência dos paradoxos porque não vemos todos os lados de uma coisa em simultâneo. O cubo paradoxal pode ser visto de várias perspectivas. À primeira vista, olhamo-lo de baixo mas, olhando de novo, o quadrado do fundo parece saltar para a frente, dando-nos a impressão de que vemos o cubo de cima. Num terceiro olhar, o objecto sólido achata-se, e em seu lugar parece emergir uma figura abstracta de doze linhas. Contudo, nunca podemos ter as três visões ao mesmo tempo. No acto da observação, o paradoxo do cubo é resolvido momentaneamente e, de acordo com a mecânica quântica, os paradoxos do mundo físico são resolvidos de maneira análoga.
Olhemos agora para um ser humano. Não poderá também a sua complexidade ser entendida mais facilmente à luz de um procedimento semelhante?
Imagem: Cubo Paradoxal
Olhando a Natureza à nossa volta, vemos que ela é extremamente bela e diversificada, mas não temos a consciência de que é feita a partir de coisas extremamente pequenas, blocos de construção com nomes estranhos, com os quais tudo é composto. E há as forças. Sem elas, as coisas não encontrariam o seu lugar; objectos e seres vivos ruiriam como castelos de cartas. Não haveria mais nada com forma e o Universo não passaria de um conjunto caótico de partículas dispersas. A compreensão do verdadeiro segredo das coisas não está somente na compreensão da matéria, mas também no entendimento daquilo que faz com que uma força seja o que é. Esta ideia é qualquer coisa que deveria tocar a nossa imaginação e é uma questão filosoficamente muito mais complexa e fundamental. Os bosões intermediários são os agentes das forças. São eles que, passeando entre as partículas, transportam a mensagem. São partículas que não têm a função de objecto, mas sobretudo de transportadoras de força. São os bosões que, finalmente, definem esta ordem de coisas que é a nossa.
Imagem: Bozão Z (www.physicsmasterclasses.org/exercises/hands-on-cern/pictures/wi_uppg3.gif)
“Ao olhar para a luz, sentiria dor, e o deslumbramento impedi-lo-ia de fixar os objectos cujas sombras via outrora.”
Platão, em A Alegoria Da Caverna (A República)
Alguns físicos de renome, principalmente David Bohm, sustentaram (e sustentam) que há um modo mais fundamental, mais profundo de descrever os eventos físicos e a realidade objectiva, ela própria entranhada em algo a que chamam de "ordem implícita", que por enquanto se tem mostrado intangível. A existir esse nível de complexidade escondida, aquilo que é o nosso entendimento das coisas pode não passar de uma mera sombra de um mundo bem mais vasto e completo, uma simples imagem holográfica da verdadeira realidade. Assim como existe uma diferença fundamental entre a leitura de um texto e a sua compreensão, entre olhar para uma foto e ver a paisagem ao vivo, entre ver um holograma e poder tocar o objecto, também conhecer a realidade apenas razoavelmente difere substancialmente de haver certezas absolutas. O entendimento da chamada "ordem implícita" pode significar um enorme salto qualitativo, quer em termos de Conhecimento, quer em termos tecnológicos. Os benefícios da compreensão de certas teorias podem não ser nem evidentes nem imediatos, mas a História tem demonstrado que, a prazo, o Saber encontra sempre aplicação...
Imagem: Sombras
Imaginem agora uma estrela em miniatura, dominada, obedecendo às rédeas do Homem. Eu sei que parece ficção, mas a União Europeia e outros seis países assinaram em Paris, no passado mês de Novembro, o acordo sobre a construção do ITER (Reactor Termonuclear Experimental Internacional, na sigla inglesa). Este é um dos projectos científicos mais ambiciosos da História, e deverá revolucionar a produção de energia mundial na segunda metade deste século. O reactor experimental de fusão ficará localizado em Caradache, a 60 quilómetros da cidade francesa de Marselha e a sua construção deverá iniciar-se já no próximo ano. A matéria-prima da fusão nuclear é o plasma de hidrogénio, uma espécie de sopa semelhante à que existe no interior das estrelas. Chamado de quarto estado da matéria, o plasma é composto por matéria ionizada, ou seja, átomos ou moléculas cujos electrões se libertaram da prisão electromagnética que os mantinha em interacção com os núcleos atómicos. Em condições extremas, com temperatura e densidade adequadas, estes núcleos chocam frequente e violentamente uns com os outros e fundem-se em etapas sucessivas, criando uma estrutura muito mais estável: o hélio. Estabilidade está associada a baixa energia; de facto, neste processo, uma imensa quantidade de energia limpa é libertada.
Imagem: Nas Nossas Mãos, As Estrelas (http://webclub.home.sapo.pt/maos-e-poder.jpg)
Há comportamentos estranhos no mundo do infinitamente pequeno. Por exemplo: assim como se fossem antigos amantes que não se conseguem esquecer um do outro, duas partículas subatómicas que interagiram um dia podem responder instantaneamente aos movimentos uma da outra, milhares de anos mais tarde, mesmo estando a anos-luz de distância. Isto ocorre contra a teoria da relatividade, uma vez que esta não permite a existência de interacções físicas ou a transmissão de informações a velocidades superiores à da luz. Este fenómeno extraordinário é chamado efeito EPR, sigla formada com as iniciais de Einstein e dos seus colaboradores Boris Podolski e Nathan Rosen, os primeiros a abordá-lo, em 1935. A interpretação mais comum da teoria quântica leva a crer na impossibilidade de jamais se compreender o efeito EPR. Contudo, Einstein defendeu até à sua morte que esta posição colocava a ciência entre duas alternativas completamente inaceitáveis: ou a realidade objectiva não passa de uma ilusão, ou a medição de uma partícula EPR viola a lei da causalidade, influenciando a outra partícula sem que seja trocada informação. Serão os tijolos da matéria assim, assustadoramente parecidos com a substância que compõe os sonhos, ou será a mecânica quântica uma teoria imperfeita?
Imagem: Entrelaçamento Quântico (www.scienceagogo.com/news/img/electron.jpg)
Em milésimos de segundo, a energia libertada pela matéria em escombros cria uma bola de fogo com temperaturas próximas às da superfície do Sol. A esfera flamejante avança em todas as direcções ao mesmo tempo, as ondas de choque resultantes da expansão arrasando tudo, como uma máquina de morte em deslocação supersónica. A matéria vaporizada pelo calor, menos densa que o ar, eleva-se como um balão, criando correntes verticais fortíssimas e arrastando consigo grandes quantidades de poeira radioactiva, formada pelos materiais fundidos próximos à detonação. Dos núcleos de plutónio em ruptura são libertados neutrões a altíssima velocidade, e com um elevado poder de penetração. Fotões de raios-X e de raios gama, semelhantes à luz mas muitíssimo mais violentos, são disparados em todos os sentidos. A energia, arrancada em profusão das mais profundas estruturas atómicas é usada com um único e tenebroso objectivo: provocar a destruição. A versão moderna da besta do Apocalipse tem a forma de um cogumelo.
Imagem: Bomba Atómica (Chris Bjornberg / Science Photo Library) (www.sciencephoto.com)
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