“Um silêncio abafado desliza pela minha mente, num inconsciente êxtase de uma noite milenar, o sonho mudo despejando uma torrente de imagens, a princípio confusas e indistintas para se tornarem tão vívidas e reais que juraria poder tocá-las. Vagueio pelos santuários de Karnak, a lua cheia iluminando os meus passos silentes, obeliscos e esfinges ladeando uma avenida imensa, as monumentais paredes do templo de Amon-Rá erguendo-se nos céus egípcios como escarpas, os pilones desenhando-se, altivos contra o fundo estrelado do firmamento. Avanço, incapaz de conter a curiosidade que me faz afoito, um verdadeiro bosque de colunas monumentais afilando-se, apesar de maciças não dando a impressão de peso, a pedra cinzelada escrevendo, a todo o perímetro, a memória de um passado ainda por esquecer, petrificados rolos de papiro sustentando o peso do tecto que se eleva mais de duas dezenas de metros acima do solo pavimentado. Ao fundo, um hectómetro separando-me dele, um vulto destaca-se, emproado, na contraluz de dezenas de archotes, o séquito escutando a prelecção, a desmesurada sala hipóstila servindo de cenário a alguma cerimónia real. Detenho-me, embriagado pelo incenso que enche o ar de um aroma doce, inebriado pela fascinação daquele momento
V.A.D. em Clepsidra
Imagem: Sethi I (http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/f/f3/Abydos_sethi.jpg)
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